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 Śivasūtravimarśinī: Seção I (aforismos 11 a 22 - pura)

Tradução pura


 Introdução

A Śivasūtravimarśinī continua: Kṣemarāja continua a comentar os aforismos.

Este é o segundo e último grupo de 12 aforismos dos 22 aforismos que formam a primeira Seção (que versa sobre Śāmbhavopāya). Como você sabe, a obra inteira é composta dos 77 aforismos dos Śivasūtra-s mais os respectivos comentários.

É claro que também inserirei os aforismos de Śiva sobre os quais Kṣemarāja estiver comentando. Apesar de que não comentarei sobre os sūtra-s originais ou sobre o comentário de Kṣemarāja, escreverei algumas notas para esclarecer certos pontos sempre que for necessário. Se você quiser uma explicação detalhada dos significados ocultos dessa escritura, vá a "Escrituras (estudo)/Śivasūtravimarśinī" na seção Trika.

Leia a Śivasūtravimarśinī e experimente Supremo Deleite, querido Śiva.

Este é um documento de "tradução pura", ou seja, você não encontrará nenhum Sânscrito original, mas haverá, às vezes, uma quantidade mínima de Sânscrito transliterado nas próprias traduções do texto. É claro, não haverá nenhuma tradução palavra por palavra. De qualquer forma, haverá Sânscrito transliterado nas notas explicativas. Se você for uma pessoa cega utilizando um leitor de tela e não quiser ler as notas, ou simplesmente quiser pular as notas, clique no respectivo link "Pular as notas" para continuar lendo o texto.

Importante: Tudo o que está entre parênteses e em itálico dentro da tradução foi agregado por mim para completar o sentido de uma determinada frase ou oração. Por sua vez, tudo o que está dentro de um duplo hífen (-- ... --) constitui informação esclarecedora adicional também agregada por mim.


Obrigado a Paulo & Claudio que traduziram este documento do inglês/espanhol para o português brasileiro.


Ao início


 Aforismo 11

Dessa forma, aquele --o Yogī-- no qual o deleite e desfrute do Quarto Estado, que consiste em uma penetração no não dualismo --ausência de diferenças--, brilha por meio do desaparecimento do universo mediante a união com o grupo de poderes nos três (estados de) vigília, etc., que foram explicados em detalhes (tanto) em conformidade com (as experiências) de um Yogī (quanto) das pessoas comuns1 , ingressa em Turyātīta --no estado além de Turya ou Turīya (o Quarto Estado)--, que foi descrito anteriormente como Consciência dotada de Absoluta Liberdade para conhecer e fazer tudo. (Entra em Turyātīta) montando, (por assim dizer), na corrente desse (deleite e desfrute)


Aquele que é um desfrutador (do supracitado "ābhoga" um divino deleite) na tríade (de vigília, sono e sono profundo) é um mestre de (seus) sentidos||11||


Aquele que vê essa tríade de vigília, etc., como borrifada da Bem-aventurança do Quarto Estado por meio da união com o grupo de poderes, como um fluxo contínuo da seiva e vigor da Bem-aventurança na qual todas as impressões residuais da diferença --dualismo-- foram dissolvidas por meio da intensidade do ingresso na experiência e lembrança desse (Quarto Estado)... (tal pessoa é) uma desfrutadora dessa tríade (e também) de Camatkāra --a Felicidade da Suprema consciência do Eu--. (Em outras palavras, ele desfruta da Bem-aventurança da consciência do Eu ao longo de toda a tríade de estados)|

Por essa razão:

"Aquele que verdadeiramente conhece essa dupla, (isto é, tanto) o que se diz (que é) o objeto de desfrute --o objeto cognoscível-- quanto o desfrutador --o conhecedor--, nos três estados (de consciência), não é contaminado (por eles ainda que possa ser) um desfrutador --experimentador-- (de tais estados)"||

De acordo com (o previamente citado) preceito, esse (grande ser) está repleto de Suprema Bem-aventurança, (adquire) inigualável soberania sobre si mesmo (e se torna) senhor (e) mestre de (seus) sentidos, que são (agora) vīra-s ou heróis2  determinados a tragar as diferenças (presentes) na existência mundana. Nos grandes textos sagrados --āmnāya-s--3 , diz-se que (esse tipo de pessoa) entrou no ser do venerável Manthānabhairava4 |

E esse (mesmo fato) foi mostrado em escrituras (tais como) o venerável Svacchandatantra, etc., após explicá(-lo) detalhadamente (por meio da seguinte estrofe e de outras):

Inclusive um Yogī que não monta, (por assim dizer,) nessa corrente (de deleite e desfrute --ābhoga-- não pode tornar-se) um senhor de (seus) sentidos, mas sim (é) apenas um ser confuso e perplexo. Isso é o que foi dito (sobre ele)|

E esse (mesmo fato) foi mostrado em escrituras (tais como) o venerável Svacchandatantra, etc., após explicá(-lo) detalhadamente (por meio da seguinte estrofe e de outras):

"Esse Yogī que vive na condição de um ser independente --um ser liberado-- por meio do Svacchandayoga --o tipo de Yoga ensinado no Svacchandatantra--, ao estar unido com o estado de Svacchanda5 , alcança igualdade com Svacchanda"||
(Ver VII, 260 em Svacchandatantra)

Esse (mesmo ensinamento) foi resumido também nas Spandakārikā-s por meio (da seguinte porção de) kārikā --aforismo--:

"(Para o perfeitamente desperto, existe, sempre e) constantemente, a percepção Disso --isto é, o Ser--, (e essa percepção do Ser) permanece (ao longo) dos três estados (de consciência)..."|
(Ver Spandakārikā-s I, 17)

||11||

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1  Leia o comentário sobre os aforismos 8, 9 e 10 dessa mesma seção.Return 

2  Da mesma forma que heróis genuínos, esses sentidos divinos de uma pessoa iluminada estão sempre perseguindo a mais alta meta da vida e o bem-estar de todos. Já não são mais meros "indriya-s" ou "sentidos" torturando, a todo momento, um indivíduo limitado, mas sim poderes supremos servindo a essa pessoa espiritualmente elevada.Return 

3  Os grandes textos sagrados são 64 e sua autoria não é humana. Esse grupo de escrituras reveladas também é denominado Bhairavaśāstra-s (escrituras de Bhairava). Bhairava é, obviamente, o Ser Supremo.Return 

4  Esse epíteto do Ser Supremo significa literalmente "Bhairava como aquele que agita, sacode e mistura (o universo)", no sentido de que Ele manifesta, mantém e dissolve esse universo em Seu Ser repetidamente.Return 

5  O termo "Svacchanda" significa literalmente tanto "a própria livre vontade" quanto "independente". Nesse contexto, Svacchanda é um ser liberado, ou seja, o Próprio Śiva, mas, ao mesmo tempo, é também a Sua Absoluta e Livre Vontade para conhecer e fazer tudo. Aplicando o afixo Taddhita apropriado (Ver Afixos), a palavra "Svācchandya" surge como resultado. Significa "liberdade". Em suma, é o estado de um Svacchanda ou ser liberado. E sim, Svācchandya é sinônimo de Svātantrya (a Liberdade Absoluta do Ser Supremo).Return 

Ao início


 Aforismo 12

Há etapas estreitamente conectadas à ascensão desse grande Yogī até o Princípio Supremo, por meio das quais se possa marcar uma elevada posição (espiritual)?|

(O Senhor Śiva, autor deses aforismos,) disse: "Há"—


As etapas do Yoga (são) uma fascinante maravilha||12||


Assim como existe (a experiência de) fascinante maravilha quando alguém vê uma realidade superior, da mesma forma, (existe) sempre (a experiência de fascinante maravilha quando) esse grande Yogī, que permanece calmo, sorridente (e) aberto (como uma flor porque o seu) grupo inteiro de sentidos (foi agora) expandido, (desfruta dos) deleites --ābhoga-- (associados à) experiência de manifestação de diversos objetos cognoscíveis. (Esse grupo de sentidos foi expandido) por meio de uma penetração em seu próprio Ser, (que é) uma massa de Consciência (repleta da) sempre nova, preeminente (e) extraordinária Felicidade da consciência do Eu. Essa fascinante maravilha (é) um estado que se torna maravilhoso repetidamente. (Essa condição é experimentada pelo Yogī) em seu próprio Ser, que consiste de ininterrupta Bem-aventurança, com ausência de satisfação completa --o Yogī nunca está plenamente satisfeito com esse estado de maravilha, ou seja, deseja mais e mais dele--. Essas etapas estão conectadas ao Yoga (ou) unidade com o Mais Elevado Princípio --o Ser Supremo--. (Essas) definidas etapas ou estações indicam repousos (do Yogī) na (sua) ascensão a Isso --o Mais Elevado Princípio--, e não condições de experiência (relacionadas a) Kanda, Bindu, etc.1 |

Isso foi dito (também) na venerável Kulayukti:

"E, quando o Ser é conhecido pelos adeptos por meio (desse mesmo) Ser, então o Ser contempla uma fascinante maravilha em Si Mesmo, realmente"||

Essa (mesma verdade) foi resumida por meio do (seguinte) aforismo (das Spandakārikā-s):

"Como (pode) esse vil caminho transmigratório (ser) daquele que permanece assombrado (ou pasmado), por assim dizer, enquanto contempla essa natureza essencial (ou Spanda) como sendo a regente (do universo inteiro)?"||
(Ver Spandakārikā-s I, 11)

||12||

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1  Embora os termos Kanda e Bindu geralmente signifiquem, respectivamente, "a fonte em forma de ovo de todas as nāḍī-s ou canais no corpo sutil" e "um ponto que simbolica o Conhecedor Supremo --Śiva--", nesse contexto, esses dois termos significam Mūlādhāra e Ājñā (os conhecidos cakra-s situados no corpo sutil).Return 

Ao início


 Aforismo 13

Desse Yogī que alcançou tais etapas do Yoga—


O Poder de Vontade (do Yogī iluminado é) o "Esplendor de Śiva", (o qual é) Kumārī||13||


Esse poder de Vontade do Yogī que chegou ao estado do Mais Alto Bhairava (é) Umā --Esplendor de Śiva--. (Essa Umā é) apenas a mais alta Senhora do Senhor Supremo, cuja --Dela-- natureza é Svātantrya ou Liberdade Absoluta. E, segundo a leitura --isto é, a interpretação-- "kumāra krīḍāyām"1 , Ela (se chama) Kumārī, (porque) está dedicada ao jogo de manifestar (e) retirar o universo --Kṣemarāja explicou o significado do aforismo de um ponto de vista "abheda", ou seja, de maneira não dual--|

E, da mesma forma, (Kumārī é aquela que) faz com que a etapa de Māyā (ou) Ku morra. (Māyā) produz o surgimento de bheda ou dualidade. (A declaração "aquela que faz com que a etapa de Māyā ou Ku morra" significa que) Ela impede que (Māyā) se espalhe e difunda. (Assim, Kumārī é aquela que tem) essa natureza ou disposição2 . Além disso, Kumārī (é essa Śakti ou Poder que) aparece brilhantemente em unidade com o Bhoktā ou Desfrutador --Śiva-- (e) nunca é desfrutada por outros --Kṣemarāja explicou o significado do aforismo de um ponto de vista "bheda-abheda", ou seja, com uma mistura de dualismo e não dualismo--|

Ou, assim como a virgem Umā, tendo abandonado todo apego, (está) sempre ocupada com a adoração que leva diretamente à unidade com o grande Senhor, assim também (é), certamente, a Vontade desse (Yogī)3 . Essa leitura foi, dessa forma, vista4  e explicada em detalhes pelos nossos Guru-s --preceptores espirituais-- --Kṣemarāja explicou o significado do aforismo de um ponto de vista "bheda", isto é, de maneira dual--|

No entanto, (esse aforismo,) tendo sido lido (como) "śaktitamā" --o mais alto Poder-- por outros (autores, de acordo com eles,) explica em pleno detalhe a preeminência ou superioridade desse (poder de Vontade) sobre conhecimento (e) ação5 |

Dessa forma, o poder de Vontade desse Yogī não é bruto como o das pessoas comuns, mas sim (é como) o Próprio Poder Supremo, (ou seja,) não obstruído em todos os lugares|

Isso foi declarado no venerável Svacchandatantra:

"A Deusa permanece como os nomes e formas de todas as deusas, permanece coberta pela Yogamāyā --o poder velador surgido do Yoga ou identificação com o Senhor--, (é) umaa virgem (e) promove o bem-estar das pessoas"||
(Ver Svacchandatantra X, 727)

(E) inclusive no muito venerável Mṛtyuñjayatantra:

"A suprema Śakti, que é não dividida --inseparável do Senhor-- (e) natural, (é) o Meu (poder) de Vontade. Ela deve ser conhecida (como tendo a mesma relação Comigo) que (a relação existente entre o) calor (e) o fogo (e entre) um raio de luz (e) o sol. Essa Śakti (é) certamente a causa do mundo inteiro!"|
(Ver I, 25-26 no Mṛtyuñjayatantra)

Essa mesma (verdade foi) indiretamente estabelecida por um aforismo (das Spandakārikā-s):

"Esse (indivíduo limitado) não dirige ou maneja o impulso do desejo. Mas, ainda assim, pondo-se em contato com a Força ou Poder do Ser, (essa) pessoa se torna igual a Isso"||
(Ver Spandakārikā-s I, 8)

||13||

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1  A primeira interpretação de Kṣemarāja tem a ver com Abheda ou Não Dualismo. A frase "kumāra krīḍāyām" implica, de maneira sucinta, que a palavra "kumārī" deriva da raiz "kumār", que significa "brincar como uma criança". O termo "krīḍāyām" (que gosta de brincar) denota que Ela gosta de brincar (como uma criança), e o Seu jogo consiste em manifestar o universo e retirá-lo de dentro de Si Mesma repetidamente. Bem, só uma curta explicação por enquanto, porque aprofundar esse tema levaria a expor sobre como a raiz "kumār" é formada e conjugada... e isso envolve um avançado conhecimento de sânscrito com que a maioria dos leitores pode apenas sonhar. Chega disso então, senão as suas mentes ficarão ainda mais confusas!Return 

2  O sábio interpreta a palavra "kumārī" como um acróstico: ku + mārī. De acordo com ele, "ku" simboliza Māyā, o poder que produz dualism (diferenças na forma de múltiplos sujeitos e objetos), enquanto "mārī" sugere "mārayati" - "Ela faz morrer". Portanto, o supremo poder de Vontade do Yogī é Kumārī, pois Ela destrói Māyā. Em outras palavras, Ela não permite que Māyā se espalhe. O autor esclareceu esse ponto adicionando "anudbhinnaprasarāṁ karoti" - "Ela impede que (Māyā) se espalhe e difunda", pois não é possível que ocorra nenhuma destruição aqui. Como o universo é essencialmente um com Śakti, falar de uma "destruição" de algo nele é apenas uma maneira simples de expressar o que é, na verdade, uma "retirada" dentro da sua Fonte, ou seja, dentro Dela Mesma.Return 

3  O autor interpreta a palavra "kumārī" como "virgem". Nesse caso, Umā é a conhecida esposa de Śiva nas estórias purânicas, ou seja, Pārvatī. O poder de Vontade de um Yogī é identificado com Pārvatī (a jovem virgem sempre ocupada com a adoração do Seu marido), pois Ela não tem filhos. Em outras palavras: "Ela nunca deu origem a nenhum universo!" Manifestação, manutenção e retirada do universo são meras formas de falar sobre processos em uma Realidade que é, paradoxalmente, imutável. Então, nunca surgiu Dela um universo, e, portanto, não é possível nenhuma manutenção/retirada dele. Esse mistério só pode ser compreendido por aqueles que foram abençoados com a graça de Deus. Posso falar dessa maneira dualista porque, no parágrafo em questão, o comentarista interpreta o aforismo de um ponto de vista "bheda", ou seja, de maneira dual.Return 

4  Não somente "leituras", mas sim escrituras inteiras aparecem diante de um sublime Yogī e ele pode, literalmente, "vê-las". Então, embora isso possa parecer estranho para a maioria das pessoas, as novas leituras, escrituras, mantra-s, etc., não são "ouvidas", mas sim "vistas" por um grande Yogī.Return 

5  Kṣemarāja está mencionando a leitura desse 13o aforismo segundo Bhāskara, o autor do célebre Śivasūtravārttika (outro importante comentário sobre os Śivasūtra-s): "इच्छा शक्तितमा कुमारी" - "Icchā śaktitamā kumārī" (traduzido resumidamente como "a Vontade, que é o mais alto Poder, (é) Kumārī". Resumindo, no Śivasūtravārttika, você encontrará que o aforismo em questão aparece como "Icchā śaktitamā kumārī" em vez de "Icchāśaktirumā kumārī". De qualquer forma, como o comentário de Kṣemarāja (a Śivasūtravimarśinī) é considerado como o mais autorizado, traduzi a versão dos Śivasūtra-s de acordo com Kṣemarāja (e não de acordo com Bhāskara e outros autores).Return 

Ao início


 Aforismo 14

Para esse tipo de (Yogī) que alcançou (esse) grande (poder) de Vontade—


Todos os fenômenos (externos ou internos são) o corpo (do Yogī iluminado)||14||


Qualquer coisa que seja perceptível (pelo Yogī, seja) externamente ou internamente, para ele, tudo isso aparece como o seu corpo e não como algo distinto (dele), devido à (sua) grande conquista (que surge na forma do sentimento) "Eu (sou) Isso" --Eu sou o universo-- como (o de) Sadāśiva1  --Kṣemarāja comentou sobre o aforismo na sua leitura usual como "Dṛśyaṁ śarīram"; mas os comentários no parágrafo seguinte serão baseados na leitura "Śarīraṁ dṛśyaṁ"--|

Além disso, (para esse tipo de Yogī), śarīra ou corpo, (seja) na forma de corpo físico, pensamento, energia vital (ou) vazio (en vigília, sonho, etc.), aparece como um fenômeno --algo objetivo-- tal como (a cor) azul, etc., e não como o percebedor, como (no caso de) um ser condicionado2 |

Dessa forma, no corpo, externamente e em todos os lugares, a sua percepção é certamente não dividida ou indiferenciada, da mesma forma que o plasma do ovo de um pavão --em outras palavras, a sua percepção é completamente homogênea, assim como esse plasma--|

Como foi declarado no venerável Vijñānabhairava:

"(Assim como) a ondas (são modos) da água, as chamas (são modos) do fogo (e) a luz (é um modo) do sol, (da mesma forma,) esses modos --como ondas-- do universo saíram de Mim, Bhairava"||

Isso foi resumido por meio dessa (porção do aforismo das Spandakārikā-s):

"... O próprio experimentador, sempre (e) em todos os lugares, permanece na forma do experimentado"||
(Ver Spandakārikā-s II, 4)

||14||

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1  Sadāśiva é o terceiro tattva ou categoria no processo de manifestação universal. Quando o Poder Supremo do Senhor extrai o universo (Idam ou Isso) a partir Dele, Idam aparece de maneira indistinta (nebulosa). Como os primeiros tattva-s ou categorias são o Senhor e Seu Poder (Śiva e Śakti), Sadāśiva realmente marca o surgimento do universo. Antes de Sadāśiva, o Senhor sente "Eu sou", mas, uma vez que Sadāśiva é manifestado, o Senhor sente "Eu sou Isso", pois Idam ou Isso (o universo) começou a ser exibido pelo Seu divino Poder. Então, por meio da sua identificação com o Ser Supremo, o Yogī tem a mesma experiência que o Ser Supremo com relação ao universo. Para mais informação, leia Trika 3.Return 

2  Aqui, Kṣemarāja indica que o significado de śarīra é "corpo", mas não meramente "corpo físico". Ele mostra que esse "corpo" também pode tomar a forma de pensamento (em sonhos), energia vital (em sono profundo) ou ainda de vazio (en Māyā). Além disso, o sábio claramente indica que o fato de que os seres limitados consideram śarīra  ou corpo como o percebedor, enquanto um ser iluminado não. Uma alma elevada percebe śarīra como outro objeto e nunca como sendo o sujeito ou percebedor. E por que os seres condicionados considerem śarīra como o percebedor? Porque estão identificados com śarīra, isto é, com o corpo físico, pensamento, energia vital ou vazio. Identificar-se com śarīra é um grave erro; porém, a pesada carga do seu condiciomaneto os força a cometer esse equívoco. E qual é a saída para eles?: "Identificar-se com sua natureza essencial, ou seja, o Senhor". No entanto, isso somente ocorre mediante o favor desse mesmo Senhor que é, paradoxalmente, eles mesmos.Return 

Ao início


 Aforismo 15

Isso que foi dito (sobre o grande Yogī), a saber, (que) há aparecimento de todos os fenômenos (externos ou internos) —também (considerando) como fenômeno, (por assim dizer,) até mesmo o que vai até o (estado de) vazio— como (o seu próprio) corpo de maneira uniforme --isto é, como uma única forma--, não é --lit. isso não é-- difícil de cumprir, mas sim1 


Mediante a união da mente com o núcleo da Consciência, (todos) os fenômenos (externos ou internos e inclusive) vazio aparecem (tal como são essencialmente)||15||


(Aqui,) hṛdaya --o núcleo ou coração-- (é) a Luz da Consciência, já que é a fundação do universo. Nesse (hṛdaya), por meio da união da mente —(isto é,) realizando concentração da inquieta (mente) Nisso --na Luz da Consciência--—, há darśana (ou) aparecimento de todos os fenônemos (externos ou internos)(ou seja,) de azul, corpo físico, energia vital (e) intelecto—, e (inclusive) de svāpa (ou) vazio —(resumidamente,) daquilo cuja natureza (é) ausência disso --isto é, dos fenômenos externos e internos--—, como o próprio corpo —(em outras palavras, há aparecimento de todos esses fenômenos e vazio) tal como eles são essencialmente, desprovidos de distinção entre sujeito (e) objeto—2 |

Não há dúvidas de que a mente que ingressa na Luz da Consciência vê o universo como saturado com essa (Luz)|

Isso (também) foi dito no venerável Vijñānabhairava:

"Aquele cujos sentidos estão fixos no éter ou espaço dentro do coração --dentro do lótus do coração--, que permanece no meio dos (dois) hemisférios (desse) lótus --isto é, onde mora o Ser--, cuja mente (é) não dividida --ou seja, cuja mente está concentrada e vê o universo como saturado com a Luz da Consciência--, obtém a mais alta fortuna ou bem-estar, oh Bela"||

Aqui, a mais alta fortuna (é), certamente, a aquisição de senhorio sobre o universo|

Com relação ao grande Yogī que atingiu o estado do Princípio Supremo, no venerável Svacchandatantra, (foi declarado) também:

"Aquele (que alcançou identidade com Bhairava --com o Senhor--) penetrando todos os (seis) cursos3  presentes (nas) entidad(es) inconscientes (ou) inanimadas e (nas) entidades conscientes (ou) animadas --resumidamente, em tudo o que se move e é estacionário dentro desse universo-- permanece como idêntico a Bhairava em todos os seres, objetos, categorias da manifestação universal e indriya-s --os dez Poderes de Percepção e Ação--4 "|
(Ver IV, 310 no Svacchandatantra)

Nas Spandakārikā-s, esse (mesmo ensinamento) foi resumido por esta (porção de aforismo):

"... assim (também), por meio do estabelecimento no próprio Ser (de uma pessoa), existirá dessa maneira (onisciência) em todos os lugares"||
(Ver Spandakārikā-s III, 7)

||15||

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1  Embora Kṣemarāja pareça estar contando uma piada, ele está certamente falando sério. O Estado Supremo não é difícil de alcançar, já que "uma pessoa é sempre o Senhor", e sobre isso não há dúvidas. De qualquer forma, do ponto de vista de um ser limitado, a tarefa parece impossível devido à sua pesada carga de limitações. Obviamente, isso é, na verdade, uma maneira de falar, pois o ser limitado é simplesmente o Próprio Senhor crendo que está "atado por Māyā" e coisas assim. Como o Senhor é absoluto, Ele também pode tornar-se "absolutamente" ignorante. Portanto, não há contradição ou exagero algum no que o sábio estabeleceu. É somente quando o Senhor engana a Si Mesmo que a tarefa de perceber todos os fenômenos como o próprio corpo parece uma missão impossível. Então, pare de enganar a Si Mesmo, querido Senhor, e acorde! De forma resumida, se o leitor ainda "pensar" que tudo o que o sábio está escrevendo tem a ver com um Senhor, um Yogī iluminado, etc., diferente dele(a), então o leitor ainda não compreendeu nada sobre essa escritura. Se esse for o caso, deve-se avisar que o leitor não está, de maneira alguma, em uma condição desejável! Bem, só um lembrete para o leitor, porque é muito comum alguém que esqueça a sua natureza quando lê esse tipo de escritura e, assim, comece a pensar que o Senhor é Alguém que existe "em algum outro lugar" fora ou "profundamente" dentro ("quão profundamente, sendo o corpo tão fino?", pergunto-me), e toda essa loucura.Return 

2  Se você sentir que está a ponto de ter um ataque cardíaco, não se preocupe, pois venho ao resgate! Primeiro, deixe-me explicar o que fiz: Como esse site também ensina Sânscrito, optei por uma tradução "literal" do comentário para que os estudantes aprendam como um texto do mundo real foi escrito em Sânscrito. A outra opção teria sido traduzir fragmento por fragmento [por exemplo, (no aforismo,) a frase "citta-saṅghaṭṭāt" (significa) "realizando concentração da inquieta (mente) Nisso --na Luz da Consciência--"]. Esteja certo de que isso teria sido realmente mais fácil de ler. No entanto, "isso não é exatamente o que o autor escreveu". Kṣemarāja descreveu cada uma das porções do aforismo de maneira contínua, e não fragmento por fragmento. Portanto, como estou ensinando Sânscrito além de traduzir textos, sempre optarei por traduzir tudo da maneira mais literal possível.

De qualquer forma, sinto-me compassivo hoje e, portanto, extrairei o parágrafo da massa de explicações adicionais que aparecem entre travessões (—...—):

"(Aqui), hṛdaya --o núcleo ou coração-- (é) a Luz da Consciência, já que é a fundação do universo. Nesse (hṛdaya), por meio da união da mente, há darśana (ou) aparecimento de todos os fenômenos (externos e internos), e (inclusive) de svāpa (ou) vazio, como o próprio corpo".

Bem, agora, o parágrafo parece claro, não é? O significado final é que, quando alguém concentra a sua mente na Luz da Consciência ali (no núcleo ou coração da Realidade), todos os fenômenos, incluindo o vazio, aparecem como não diferentes (ou seja, como o próprio corpo) dele(a). Em outras palavras, tudo é percebido em unidade com a Luz da Consciência. Osábio expressará essa verdade no próximo parágrafo. Use o que está entre travessões como informação adicional sobre cada uma das porções do parágrafo.

No entanto, além do fato de que não posso ficar fazendo esse tipo de extração a todo momento, lembre-se de que também estou ensinando Sânscrito nesse website e "preciso" que os estudantes o experimentem "tal como é nesse texto medieval", ou seja, "extremamente difícil!". Em tipo de Sânscrito é o estudado a partir de uma gramática, e um tipo muito diferente é aquele que você lê em escrituras do mundo real, onde os autores "em geral" não escreverão como o esperado. Mesmo as gramáticas superiores não podem incluir "todas" as maneiras de expressar uma mesma coisa em Sânscrito por uma mera questão de tamanho (fazer isso requereria volumes), pois os estilos variam segundo o tempo e o contexto. As dificuldades inerentes de traduzir um texto medieval que lida com Trika não são os mesmos que você encontrará ao traduzir, por exemplo, uma escritura mais antiga que trate de um sistema filosófico diferente. Portanto, traduzir um texto sânscrito "real" como este é uma tarefa repleta de dificuldades "reais" de todo estudante sério da língua sagrada deve encarar cedo ou tarde. Continue lendo, por favor.Return 

3  Esse tema foi explicado em detalhes em Trika: Os Seis Cursos.Return 

4  Não posso comentar muito aqui sobre esse complexo tema, senão essa página ficará extremamente longa, mas o sábio Kṣemarāja também escreveu um volumoso comentário sobre o Svacchandatantra no qual ele descreve completamente o significado secreto desse aforismo. Ele conclui o seu comentário sobre essa 310a estrofe que se encontra no 4th paṭala (seção) afirmando que: "एषैव च निर्व्युत्थानसमाध्यात्मा महारहस्यभूता॥" - "Eṣaiva ca nirvyutthānasamādhyātmā mahārahasyabhūtā||" ou "Essa (indestrutível absorção no mais alto Bhairava) é o grande segredo que consiste em Nirvyutthānasamādhi ou Perfeita Concentração desprovida de vyutthāna --qualquer estado que não seja o Samādhi (Perfeita Concentração)--". Resumindo: Uma vez que o Yogī alcança esse tipo de absorção no Senhor, ele "nunca" returna ao estado comum de consciência!Return 

Ao início


 Aforismo 16

Aqui, Ele --Śiva, o autor dos Śivasūtra-s-- mencionou outro meio (para dar-se conta da própria identidade com o mais alto Bhairava)


Ou por meio da união com o Princípio Puro, (o Yogī se torna alguém em que) está ausente o (escravizante) poder (que existe em) um ser limitado e condicionado||16||


O Princípio Puro é denominado Paramaśiva --o Śiva Supremo--. Quando (o Yogī) está nesse (Paramaśiva) --ou seja, quando o Yogī se dá conta Dele--, torna-se consciente do universo (desta forma:) "Este (universo) é composto somente dessa (Realidade)"; então, dessa forma, esse (Yogī) torna-se o senhor do mundo inteiro, assim como Sadāśiva, no qual o escravizante poder conhecido como paśu está ausente1 |

Essa (verdade) foi expressa (também) no venerável Lakṣmīkaulārṇava:

"Esses pratyaya-s acompanhados por exclamações de louvor que são declaradas ou ensinadas para o sucesso da iniciação não valem (nem sequer) a décima sexta parte de Sandhāna, oh Deusa"2 ||

(E) no venerável Vijñānabhairava:

"Uma pessoa deveria considerar, com uma mente livre de pensamentos, (o seu) corpo inteiro ou o mundo simultaneamente --sem sucessão-- como composto de Consciência; (se ela fizer isso, haverá) surgimento da (Realidade) Suprema (para ela)"3 |

Esse mesmo (ensinamento) foi resumido por um aforismo (das Spandakārikā-s):

"Ou aquele que tem esse conhecimento ou compreensão4  (e) está constantemente unido (com o Ser Supremo) vê o mundo inteiro como um jogo (divino). Ele está libertado em vida, (sobre isso) não há nenhuma dúvida"||
(Ver Spandakārikā-s II, 5)

||16||

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1  Para mais informação sobre "Paramaśiva" e "Sadāśiva", ver Trika 2 e Trika 3.Return 

2  O termo "pratyaya-s" pode ser traduzido de uma enorme quantidade de maneiras: "ideias, meditações religiosas, etc.", mas, nesse contexto, significa "देशादिव्यवहितविप्रकृष्टवस्तुज्ञानानि" - "deśādivyavahitaviprakṛṣṭavastujñānāni" ou "cognições sobre remotas realidades separadas (de alguém) por espaço, etc." (por exemplo, mundos distantes). Durante o rito de iniciação, a pessoa que está sendo iniciada se torna consciente dessas realidades pela graça do Senhor, que aparece como o próprio ritual. É muito comum pronunciar exclamações de louvor (interjeições cantadas) durante o andamento da iniciação. Por sua vez, o Senhor Śiva diz à Deusa que isso não vale nem sequer a décima sexta parte de Sandhāna. E o que é isso? Sandhāna é definido como "शुद्धतत्त्वविमर्श" - "śuddhatattvavimarśa" ou "consciência do Princípio Puro". Portanto, o que o Senhor está afirmando é que essas coisas são insignificantes em comparação com tornar-se consciente do Princípio Puro. Já que a própria Deusa é esse "vimarśa" ou consciência, esse Sandhāna só pode ser alcançado por meio Dela Mesma. Por essa razão, Ela é conhecida como a ponte que conduz ao Princípio Puro (Paramaśiva). Bem, essa explicação foi somente um mero vislumbre!Return 

3  Na versão do Vijñānabhairava comentada pelo próprio Kṣemarāja, o termo "paramodbhavaḥ" (parama-udbhavaḥ) muda para "परमोदयः" - "paramodayaḥ" (parama-udayaḥ), mas o significado é o mesmo, pois "udbhavaḥ" e "udayaḥ" são sinônimos nesse contexto.Return 

4  Conhecimento sobre o quê? Para entender isso, deve-se ler a última parte do aforismo anterior nas Spandakārikā-s. No final dele (II,4), o autor diz: "O próprio experimentador, sempre (e) em todos os lugares, permanece na forma do experimentado". Portanto, esse é o tipo de conhecimento sobre o qual o autor das Spandakārikā-s está falando em II, 5 (isto é, no 5o aforismo da Seção II). O significado está completamente claro agora!Return 

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 Aforismo 17

Para esse Yogī cuja natureza (é) tal conhecimento1 


A firme e constante consciência (de "Eu sou Śiva") é o conhecimento do Ser||17||


Esse vitarka (ou) firme e constante consciência de que "Eu sou Śiva, o Ser do universo" (é) o seu --do Yogī-- conhecimento do Ser|

Isso (também) é estabelecido no venerável Vijñānabhairava:

"'O Senhor Supremo (é) onisciente, onipotente e onipresente. Ele (é) eu mesmo, (já que) tenho a característica de Śiva'. Com essa firme (convicção), alguém se torna Śiva"||

Esse (mesmo ensinamento) foi mencionado também nas Spandakārikā-s por meio desta (porção de aforismo):

"... somente isso (é) a percepção do Ser"||
(Ver Spandakārikā-s II, 7)

 

Nessa (porção de aforismo), essa percepção (ou) captura do Ser (que é descrita é) apenas conhecimento do Ser. Que (existe) ausência de diferença --ou seja, identidade-- com relação a Śiva —a essência do universo—... (bem,) também se deseja expressar esse significado (adicional por meio dessa declaração nas Spandakārikā-s)2 ||17||

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1  Leia a última porção do comentário sobre o aforismo anterior para entender melhor essa introdução ao 17o aforismo.Return 

2  O que está entre travessões se refere a Śiva, obviamente. O significado adicional de que alguém não é distinto do Senhor está escondido na frase "somente isso (é) a percepção do Ser", segundo Kṣemarāja.Return 

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 Aforismo 18

Moreover, of this (Yogī)


A Bem-Aventurança (que o Yogī sente ao permanecer como o Conhecedor ou Percebedor) do mundo (—o qual consiste de sujeitos e objetos— é seu) deleite de Samādhi||18||


O loka ou mundo (é tanto) "o que se percebe" —(ou seja,) a multidão de objetos— quanto "o que percebe" —(isto é,) o grupo ou classe de sujeitos—. Embora isso seja evidente1  (para todos), de acordo com o preceito estebelecido no venerável Vijñānabhairava:

"A consciência de objeto (e) sujeito é comum a todos os seres encarnados; mas, no caso dos Yogī-s, esta (é a) diferença: há atenção no que se refere à relação (entre objeto e sujeito)"||

(então,) essa bem-aventurança, que consiste em camatkāra --a felicidade da consciência pura do Eu--, por causa da (sua) atenção no que se refere ao (seu) repouso no estado de um Conhecedor ou Percebedor, (é) o seu deleite de Samādhi2 |

(Também) foi dito, nesse mesmo (livro) --no Vijñānabhairava--:

"Uma pessoa deveria lembrar-se do mundo inteiro ou do seu próprio corpo como repleto da sua própria bem-aventurança. Simultaneamente --isto é, quando uma pessoa é capaz de se lembrar dessa maneira--, ela fica cheia da Felicidade Mais Elevada devido ao seu próprio Néctar"||

Essa mesma (verdade) foi resumida por esse (aforismo):

"Somente isso (é) a obtenção do Néctar que leva à Imortalidade..."
(Ver Spandakārikā-s II, 7)

Além disso, esse deleite de Samādhi --isto é, do estado de conservar uma contínua consciência do seu estado como o Conhecedor-- que pertence àquele que se regozija no próprio Ser culmina na manifestação da sua bem-aventurança entre as pessoas que o observam --lit. que observam a essa pessoa-- ali --nesse lugar e nesse estado--. (Isso acontece) através da transferência de felicidade|

Isso também está completamente de acordo com a estrofe do venerável Candrajñāna que foi citada anteriormente no (comentário sobre o) sétimo aforismo da primeira Seção||18||

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1  Não posso traduzir as palavras individualmente, pois ficaria completamente sem sentido em português: "nisso (tasmin) nisso que é evidente (sphurati) nisso que é (sati)". A frase está em Locativo absoluto (um tipo especial de construção em Sânscrito), e, portanto, deve-se adicionar "quando, enquanto, embora, etc." e traduzir tudo no Nominativo para dar estrutura à frase em português. Nesse caso, devo adicionar "embora". Tive que esclarecer esse fato até certo ponto, já que algumas pessoas poderiam pensar que estou trapaceando aqui, pois ignoro o significado de cada uma dessas três palavras. Como, na maior parte do tempo, não posso explicar esse tipo de complicação gramatical, pois requereria um número excessivo de notas explicativas, simplesmente confie em mim, por favor.Return 

2  Nesse contexto, a palavra "Samādhi" não deve ser entendida como "Concentração Perfeita" (como em uma espécie de meditação profunda com os olhos fechados). Não, aqui, é o estado onde uma pessoa está consciente apenas do seu estado como o Conhecedor ou Percebedor Supremo. Esse é o estado de Śiva, e não pode ser alcançado por absolutamente nenhum esforço! Só pode ser alcançado por meio da Graça Divina. Então, tem a ver exclusivamente com a Sua livre Vontade.Return 

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 Aforismo 19

Agora, (o seguinte aforismo) mostra o Vibhūtiyoga --Yoga dos poderes sobrenaturais-- de tal Yogī—


Ao estar unido com o Poder (de Vontade, há) produção ou criação de corpos (segundo os desejos do Yogī)||19||


Por meio do décimo terceiro aforismo da primeira Seção, (a saber,) "O poder de Vontade (do Yogī iluminado é) o 'Esplendor de Śiva', (o qual é) Kumārī", descreve-se o seu Poder ou Śakti. Quando ele, (através de uma intensa consciência), une-se a ela --com a sua Icchāśakti ou poder de Vontade--; (em suma, quando) ele está firmemente absorto nesse (poder de Vontade), então, por meio desse (poder), o seu corpo é produzido --é trazido à existência-- à vontade --lit. como quiser--|

Isso é o que foi declarado no muito venerável Mṛtyuñjaya --isto é, o Netratantra-- começando (pela estrofe 36 do 7th adhikāra ou capítulo):

"A partir dali --a partir desse estado de Paramaśiva ganho pelo Yogī1 --, procede o Poder que está desprovido de perceptibilidade (e) doença2 . Esse (Poder) foi indicado (como) Icchā --Vontade--, certamente, a qual, (posteriormente,) aparece na forma de Jñāna --Conhecimento-- (e) Kriyā --Ação--3 "||4 

(e terminando com a estrofe 40 do mesmo adhikāra ou capítulo:)

"Ela --a Mais Alta Śakti-- (é), de diversas maneiras, a fonte de todos os deuses, bem como de todos os poderes ou śakti-s. A sua natureza (é) fogo e lua5 . Tudo procede Dela"||

O estado exaltado da união com Śakti através de intensa concentração foi estabelecido no Lakṣmīkaulārṇava (pela estrofe seguinte e por) outras (estrofes):

"Sem união (com Śakti) através de intensa concentração, não há nem iniciação, nem consumação de poderes sobrenaturais, nem mantra, nem um stratagema relacionado aos mantra-s, nem —de nenhuma maneira— maestria6  em Yoga"||

Esse mesmo (ensinamento) foi resumido por esse (aforismo):

"Da mesma forma que Aquele que mantém (esse mundo), quando se pede a ele com desejo, produz (todas) a coisas que permanecem no coração dessa alma encarnada que está desperta depois de provocar o surgimento da lua (e) do sol7 "||
(Ver Spandakārikā-s III, 1)

O Criador, (isto é,) o Grande Senhor --epíteto de Śiva-- produz --cumpre-- (todas) as coisas, que são criações diversas (e) completamente novas, etc., que permanecem no coração do Yogī encarnado que não abandonou o seu desejo (de ficar) no corpo. (O Ser Supremo faz isso, primeiramente,) abrindo o fluxo composto de lua --apāna, a energia vital que entra com a inspiração-- (e) sol --prāṇa, a energia vital que sai com a expiração-- por meio de Prakāśa --luz que revela-- e Ānanda --bem-aventurança--, e, (então,) provocando o surgimento do poder ou śakti --samāna-- que consiste em um equilíbrio de lua ou apāna (e) sol ou prāṇa8 . (Posteriormente,) após suprimir essa śakti (chamada samāna) --ou seja, depois de reestabelecer as funções normais de apāna e prāṇa--, (o Senhor produz) externamente (os desejos desse Yogī). Esse é o significado desse (aforismo nas Spandakārikā-s), realmente9 .

"Assim também em sonhos, [permanecendo no canal central, (Ele) certamente revela sempre (e) muito claramente] as coisas desejadas" [àquele que não negligencia a sua súplica].10 
(Ver Spandakārikā-s III, 2)

Como foi mostrado por mim no Spandanirṇaya, (o assunto relacionado à) liberdade (do Yogī, inclusive) em sonhos, tal como é explicado nessa estrofe, foi usado como contra-exemplo||19||

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1  Eu sei isso porque li as estrofes anteriores no Netratantra. O mesmo sábio que está comentando aqui sobre os Śivasūtra-s —ou seja, Kṣemarāja— também compôs um extenso comentário sobre o Netratantra. Paramaśiva é simplesmente a Mais Alta Realidade. Leia Trika 2 para obter informação adicional.Return 

2  Isso quer dizer que o poder de Vontade não é nem um pouco visível ou perceptível. Além disso, não é afetado pela doença conhecida como Māyā (tattva ou categoria 6 no processo de manifestação universal). Māyā é um véu de ignorância que cobre a própria natureza essencial.Return 

3  Esse tema foi explicado em detalhes em Trika 3.Return 

4  Essa estrofe também tem uma diferente leitura (só uma leve mudança):

"A partir dali --a partir desse estado de Paramaśiva ganho pelo Yogī--, procede o Poder que está desprovido de perceptibilidade (e) doença, (e) que foi indicado (como) nada mais que Icchā --Vontade--. (Essa mesma Vontade, posteriormente,) aparece na forma de Jñāna --Conhecimento-- (e) Kriyā --Ação--"||

Muito bem, agora você tem ambas as versões.Return 

5  Aqui, fogo e lua significam prāṇa (a energia vital que sai do seu sistema quando expira) e apāna (a energia vital que ingressa no seu sistema quando inspira).Return 

6  Se você consultar um dicionário, encontrará que "ākarṣaṇa" geralmente significa "que puxa, que traz para perto, que atrai, etc.". Aqui, traduzo-o como "domínio", porque a raiz original não é "ākṛṣ", obviamente, mas sim "kṛṣ" (já que "ā" é um prefixo adicionado à raiz), e um dos significados de "kṛṣ" é "pôr sob controle, dominar, tornar-se mestre de". Agora está claro!Return 

7  Os termos lua e sol dependem do nível em que um aspirante está posicionado. Em Āṇavopāya, lua e sol representam apāna e prāṇa, respectivamente (leia a nota 5 acima). Em Śāktopāya, simbolizam Jñānaśakti (Poder de conhecimento) e Kriyāśakti (Poder de ação). Finalmente, em Śāmbhavopāya, simbolizam Vimarśa (Śakti) e Prakāśa (Śiva). Leia Meditação 1 para aprender mais.Return 

8  Leia Uccāra em Meditação 4 para ter uma melhor compreensão sobre o que o sábio está falando.Return 

9  O Senhor Supremo, que inspira o grande Yogī com luz reveladora e bem-aventurança, abre o fluxo de apāna e prāṇa (ou seja, Ele torna essa pessoa consciente da sua própria inspiração e expiração). Então, Ele faz com que surja samāna, equilibrando o fluxo de apāna e prāṇa na área do umbigo (o processo de respiração para aqui). Finalmente, quando o Ser Supremo aplaca ou suprime samāna, o fluxo natural de inspiração e expiração volta. Nesse momento, todas as coisas desejadas pelo Yogī aparecem externamente diante dele. Ninguém pode obter esse poder sem a Sua Graça.Return 

10  Tive que adicionar o resto da estrofe entre colchetes, senão a frase tão faria nenhum sentido. Em outras ocasiões, posso adicionar a tradução curta junto com três pontos, mas não posso fazer isso nesse caso em particular.Return 

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 Aforismo 20

Por meio da majestade disso --isto é, da união com sua Icchāśakti ou poder de Vontade--, outros poderes sobrenaturais, conforme desejar (o Yogī), sobrevêm a ele também. É isso que (Śiva) disse (no próximo aforismo)


(Os outros poderes sobrenaturais do Yogī iluminado são: o poder de) unir entidades existentes; (o poder de) separá-las todas --isto é, as entidades existentes-- (e o poder de) juntar --saṅghaṭṭa-- tudo (que foi separado por espaço e tempo)||20||


Os bhūta-s --entidades existentes-- consistem em corpo, energia vital, objetos, etc. Sandhāna --que une-- dessas (entidades existentes) --ou seja, bhūtasandhāna-- (é, então, a mesma coisa que) promover o aumento de bem-estar, etc., em certos casos1 . Pṛthaktva (é) separação de corpo, etc., para aliviar enfermidades, etc., e coisas similares2 . E juntar tudo o que foi separado por espaço, tempo, etc., (é) tornar (todas essas coisas) objetos do (seu) conhecimento, e por aí vai3 . (Esse grupo de três poderes) sobrevém a ele quando existe união com o poder de (Vontade) conforme descrito anteriormente|

Isso aparece --isto é, foi abordado-- em todos os Āgama-s --escrituras reveladas--, nos capítulos sobre sādhana --métodos para alcançar consumação, domínio, etc.--|

Esse mesmo (ensinamento) foi mostrado, com argumentos fundados, na (seção) Vibhūtispanda --poderes sobrenaturais que se originam do Spanda-- das Spandakārikā-s por meio (da seguinte estrofe e) de outras (estrofes)|

"Inclusive uma pessoa fraca, tendo tomado esse (Spanda ou Força Cósmica), ocupa-se (de fazer) o que tem que fazer (e, como consequência, tem sucesso) por meio desse mesmo Princípio. Da mesma forma, aquele que está extremamente faminto oculta (o seu) desejo de comer"||
(Ver Spandakārikā-s III, 6)

"A depressão (é como) um saqueador no corpo. Desliza-se a partir da ignorância. Se for destruída por meio desse Unmeṣa --ver o próximo aforismo--, como poderia existir essa (depressão) sem (a sua) causa?"||
(Ver Spandakārikā-s III, 8)

"Sem dúvida, assim como uma coisa que é percebida (a princípio) de maneira confusa ou indistinta, mesmo que uma mente (extremamente) atenta (esteja envolvida no processo de percepção), aparece mais claramente depois, quando contemplada por meio do vigoroso exercício do próprio poder, da mesma forma, tomando posse da Força (Cósmica), qualquer coisa que realmente existe em qualquer forma, em qualquer lugar, em qualquer condição, essa (mesma coisa) se manifesta imediatamente dessa maneira"||
(Ver Spandakārikā-s III, 4-5)

||20||

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1  Por exemplo, um corpo a ponto de morrer de inanição pode ser nutrido por esse grande Yogī simplesmente desejando que esse corpo entre em contato com alimento. Não há necessidade de que ele traga alimento, fisicamente falando.Return 

2  Por exemplo, ele pode separar um tumor de um corpo para curá-lo.Return 

3  Por exemplo, ele pode saber exatamente o que ocorre em um momento específico no passado ou no futuro. Ou também, ele pode saber o que está ocorrendo no outro lado do planeta nesse exato momento. Pode fazer todas essas coisas conforme desejar, embora, na maior parte do tempo, aconteçam espontaneamente devido ao seu estado extraordinário de consciência.

Embora o Ser more em tudo, esses poderes sobrenaturais mencionados nesse aforismo estão tão longe dos seres comuns cheios de condicionamento que é "aparentemente" inútil escrever sobre faculdades tão sublimes, uma vez que a vasta maioria das pessoas simplesmente não entende nada sobre isso (incluindo quase todas as pessoas spirituais, é claro... a única diferença é que as pessoas spirituais têm "egos espirituais que pensam que entendem completamente", enquanto o resto tem egos mundanos que simplesmente não se interessam nesses assuntos... de qualquer maneira, é a mesma peste, mas com cores diferentes). Assim, todos eles NÃO são extraordinários. Na verdade, é "aparentemente" ridículo falar sobre essas coisas sublimes vendo a impotente condição do indivíduo limitado, que está a todo momento se comportando como um mendigo aflito. Bem, devo traduzir a escritura em sua totalidade, ainda que, nesse mundo, a quantidade de grandes Yogī-s como esse sobre o qual Kṣemarāja comenta poderia certamente ser contada com os dedos de uma mão.

Em suma, a minha tarefa de traduzir essa difícil escritura parece uma piada ou tempo desperdiçado considerando a condição do aspirante mediano de Yoga. De qualquer maneira, existem argumentos mais sólidos para apoiar os meus esforços: Como a primeira Seção dos Śivasūtra-s versa sobre Śāmbhavopāya (o meio que pertence a Śiva), todos esses ensinamentos e conquistas estão destinados às grandes personalidades que percorrem esse caminho (muito poucas, realmente). O resto dos aspirantes, que estão, em sua maioria, obrigados a percorrer o caminho de Āṇavopāya (o meio que pertence ao ser limitado), só compreenderão os significados até o seu nível. Conhecer sobre quais os estados que eles podem alcançar também pode ser enriquecedor. Então, embora pareça absurdo, à primeira vista, passar tantas horas traduzindo todas essas descrições sobre as conquistas de um grande Yogī quando, "na prática", 99% dos aspirantes mal conseguem meditar no Ser por uns quinze minutos de forma contínua todos os dias, faz sentido, de alguma forma, se for considerado que a primeira Seção está relacionada ao Śāmbhavopāya superior.

Além disso, há uma razão mais profunda para que eu me dê ao trabalho de fazer tudo isso... bem, é a minha oferenda ao Dono de todo o universo, que é o único Fazedor de todas as ações e o verdadeiro Autor de todas as escrituras sagradas. Que esse Senhor seja sempre louvado! Só um comentário que surgiu nesse estado especial em que estou ao traduzir. Muito bem, continue lendo os ensinamentos.Return 

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 Aforismo 21

No entanto, quando (um tão grande Yogī) não anseia por limitados poderes sobrenaturais, (mas sim) deseja expandir(-se) --lit. expansão-- como o Ser do universo, então, (sobrevém a ele)


(O Yogī conquista) plena aquisição de domínio sobre o grupo coletivo de poderes por meio do surgimento de Śuddhavidyā||21||


Quando (o Yogī), com desejo de expandir(-se) --lit. expansão-- como o Ser do universo, une-se com o seu poder (de Vontade) através de intensa consciência, então, por meio do surgimento de Śuddhavidyā, (que aparece como o sentimento de) "Eu (sou) tudo", ele tem êxito em alcançar o seu estado como Maheśvara, o Grande Senhor --epíteto de Śiva-- na forma de senhorio sobre o próprio (e) universal grupo coletivo de poderes|1 

Isso foi descrito (também) no Svacchandatantra:

"Portanto, já que não há nenhuma outra, Ela (é) realmente a Mais Alta Vidyā --divino Conhecimento--. Aqui --quando brota a Mais Alta Vidyā--, verdadeiramente, (o Yogī) adquire as qualidades superiores de onisciência, etc., simultaneamente. (1) Ela produz investigação da característica sem começo (do Senhor) --Sua absoluta Liberdade ou Svātantrya--; (2) desperta e faz perceber/compreender o estado do Ser Supremo; (e) (3) exclui o que não é o estado do Ser Supremo; por causa de (tudo) isso, Ela é denominada 'Vidyā'. Estabelecido ali --no estado desprovido de mente (unmanā), no Ser Supremo--, ele manifesta a Luz Mais Elevada --isto é, a Luz do Senhor--, a Suprema Causa. Aquele que está estabelecido nessa Luz --tejas-- Mais Elevada --para-- que se manifesta --vyakta-- alcança o estado de Śiva"||2 
(Ver IV, 396-397 em Svacchandatantra)

A mesma coisa foi resumida por essa (estrofe nas Spandakārikā-s):

"Quando (um Yogī) que deseja ver, por assim dizer, a todos os objetos, permanece penetrando-os (todos), então, qual (é o sentido) de falar muito (sobre isso)? Ele perceberá ou experimentará (isso) por si mesmo!"||
(Ver Spandakārikā-s III, 11)

||21||

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1  O termo Śuddhavidyā não é o quinto tattva ou categoria da manifestação universal, que também é conhecida como Sadvidyā. Aqui, significa "Conhecimento Puro", ou seja, a consciência divina que faz com que alguém experimente "Eu sou tudo". Esse estado de dar-se conta no qual alguém percebe Śiva em tudo também se chama Śivavyāpti. Após alcançar tal condição, o grande Yogī atinge o estado Śiva e, consequentemente, torna-se o Mestre do grupo inteiro de poderes que aparece como universo.Return 

2  Os significados de certas palavras técnicas aqui estão baseados, em sua maioria, no extenso comentário de Kṣemarāja sobre o Svacchandatantra. Por exemplo, ele especifica que "vedanā" significa, nesse contexto "विचारणा" - "vicāraṇā" (que reflete, que produz investigação, etc.). É por isso que a minha tradução foi "produz investigação". Outros termos tais como "bodhanā" incluem tanto a tradução normal (a que se encontra em dicionários) quanto a tradução técnica dada pelo sábio da secreta tradição. Então, simplesmente confie em mim, amigo, pois sei perfeitamente o que estou fazendo. Não há trapaças, tenha certeza disso.Return 

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 Aforismo 22

Mas, quando (o grande Yogī) deseja somente deleitar-se no próprio Ser, então ele --lit. "dele" ou "para ele"--—


Unindo-se com o Grande Lago, (o Yogī tem) a experiência da fonte geradora --virilidade ou potência-- de (todos) os mantra-s||22||


A muito venerável Consciência Suprema que emite o universo, que começa com o poder de Vontade (e) termina nos objetos brutos1 , (é) um Grande Lago devido à (sua) associação com as características (de) (1) pôr em movimento todas as correntes ou fluxos (tais como) o grupo de Khecarī, etc.2 , (2) ser perfeitamente clara e transparente, (3) não estar coberta ou velada, (4) ser profunda, etc. Unindo-se a esse (Grande Lago em outras palavras,) sendo internamente consciente da (própria e) incessante identidade com ele, (então,) manifesta-se, como uma forma do próprio Ser, a experiência da fonte geradora --virilidade ou potência-- de (todos) os mantra-s, a qual --a força geradora-- está repleta da Mais Alta consciência do Eu, que se expande (na forma) de uma multidão de palavras|

Por essa mesma razão, no venerável Mālinīvijaya, começando com:

"Ela, que (é) o Poder do Criador do mundo..."||
(Ver III, 5 no Mālinīvijaya)

(e,) tendo exibido que a forma Mātṛkā (e) Mālinī —que constitui o universo inteiro— de Śakti --o divino Poder do Senhor-- se compõe de uma variedade de cinquenta (letras) encabeçadas pelo (poder) de Vontade, etc., foi mostrado o surgimento do mantra --de "Aham" ou a Suprema consciência do Eu-- a partir dessa (mesma Śakti)|3 

Dessa forma, a Própria Mais Alta Śakti (é) o Grande Lago. Portanto, foi corretamente dito (que,) por meio da união com Ela, (o Yogī tem) a experiência da fonte geradora --virilidade ou potência-- de (todos os) mantra-s cujas naturezas (são) Mātṛkā (e) Mālinī|

Isso (foi) indiretamente explicado pela frase inicial (do seguinte aforismo das Spandakārikā-s):

"Tomando posse dessa Força, os Mantra-s..."||
(Ver Spandakārikā-s II, 1)

Portanto, tendo começado (essa escritura) dessa forma: "A Consciência que é onisciente e onipotente (é) o Ser, ou a verdadeira natureza da Realidade" —aforismo 1 da primeira Seção— a aquisição de Bhairava --isto é, dar-se conta do Ser--, que é um repentino brilho ou elevação de Consciência divina, como foi descrito (no quinto aforismo), extingue toda escravidão que consiste em ignorância sobre Isso --sobre Bhairava-- manifestada pela Sua Liberdade Absoluta. (Tal aquisição de Bhairava) faz com que o universo fique repleto de Néctar através da sua própria Bem-aventurança e concede todos os poderes sobrenaturais e perfeições até (a própria) entrada na fonte geradora --virilidade ou potência-- de (todos) os mantra-s|

Dessa maneira, essa primeira Seção foi descrita como o desdobramento do Śāmbhavopāya --o meio que pertence a Śambhu, isto é, a Śiva--|

No entanto, aqui no meio, mencionou-se a natureza essencial de Śakti. Isso (foi feito) com o propósito de mostrar o Poder relativo a Śiva. Que haja prosperidade (para todos os seres)!||22||

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1  Em outras palavras, o universo começa com o terceiro tattva ou categoria (Sadāśiva) e termina nos objetos brutos compostos por Mahābhūta-s (tattva-s 32-36).Return 

2  Khecarī, Gocarī, Dikcarī e Bhūcarī são os grupos de poderes (śakti-s) mencionados. O primeiro grupo tem a ver com o experimentador limitado, o segundo com o seu intelecto-ego-mente, o terceiro com os sentidos externos e o último com os objetos brutos (objetos externos).Return 

3  Devo explicar a você, até certo ponto, esse difícil parágrafo. O alfabeto sânscrito é exibido de duas maneiras: Mātṛkā (e) Mālinī. a primeira é a maneira regular de apresentá-lo (Ver Alfabeto sânscrito), enquanto a última é a maneira irregular (ou promíscua) de apresentá-lo (Ver Tantrismo). O alfabeto regular começa com "a" e termina com "ha", enquanto o irregular começa com "na" e termina com "pha". Aham (que significa "Eu") como o mantra da Suprema consciência do Eu denota que inclui o universo inteiro (pois inclui "a" e "ha", todo o alfabeto sânscrito em sua forma Mātṛkā). A origem dessas duas formas de dispor o alfabeto provém de duas importantes obras que são sagradas para o Trika: Svacchandatantra e Mālinīvijaya (também denominado Mālinīvijayottara). O Svacchandatantra menciona apenas a forma Mātṛkā do alfabeto, enquanto o Mālinīvijaya encoraja os aspirantes a usar a forma Mālinī. A forma pela qual as letras são ordenadas é muito importante para os rituais de nyāsa (See Ritual tântrico 1), onde cada parte do corpo é associada a uma letra/som sânscrita específica.

A expressão: "—que constitui o universo inteiro—" refere-se a "a forma Mātṛkā (e) Mālinī". Tive que usar dois travessões por conveniência, senão a oração teria ficado mais difícil de entender do que já é.

Finalmente, mais uma coisa: Mātṛkā também é conhecida como Pūrvamālinī, enquanto Mālinī também é denominada Uttaramālinī. Muito bem, basta de revelar esses mistérios por enquanto.Return 

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 Fim da Seção I

Aqui, termina a primeira Seção, chamada Śāmbhavopāyaprakāśana --(a Seção) que revela o meio que pertence a Śambhu, isto é, Śiva--, na Śivasūtravimarśinī, escrita pelo venerável Kṣemarāja, que depende dos pés de lótus --ou seja, pés belos como um lótus-- do eminente preceptor espiritual Abhinavagupta, o grande devoto de Maheśvara, Grande Senhor --epíteto de Śiva--||1||

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 Informação adicional

Gabriel Pradīpaka

Este documento foi concebido por Gabriel Pradīpaka, um dos dois fundadores deste site, e guru espiritual versado em idioma Sânscrito e filosofia Trika.

Para maior informação sobre Sânscrito, Yoga e Filosofia Indiana; ou se você quiser fazer um comentário, perguntar algo ou corrigir algum erro, sinta-se à vontade para enviar um e-mail: Este é nosso endereço de e-mail.